TV CONSUMIDOR Masper TV ONLINE TOP Consumidor NOTÍCIAS RECOMENDAMOS QUEM SOMOS CONTATO  
Antonieta Barbosa – advogada
   
     
 


22/11/2010

Antonieta Barbosa – advogada
O silêncio dos inocentes

Eles são centenas ou milhares. Magros, doentes e inconvenientes. Transportados de qualquer jeito, amontoados e calados. Eles não querem muito. Apenas ser tratados como seres humanos e não como um número nas estatísticas

De Arcoverde, Pesqueira, Lagedo ou Garanhuns, em direção a Recife, ou a qualquer outro centro de tratamento de alta complexidade, eles chegam aos milhares num desfile macabro que se repete quase diariamente, sob nossos olhares indiferentes, na esperança de aliviar seu sofrimento.

Mas quem se importa com as suas dores e os seus tumores?

O câncer os abateu e a frieza da cidade grande os rejeitou. A despeito de tudo eles vêm. Sem nada pedir. O seu semblante é incômodo porque nos joga na cara a nossa omissão e a nossa falta de compromisso.

Eles se transformaram em invisíveis sombras humanas, diante do admirável mundo novo das grandes metrópoles, sem direitos, sem vez e sem voz.

Sequer sabem se voltarão as suas cidades ou se verão mais uma vez suas famílias. Na bagagem apenas a dor, o abandono e a incerteza misturados a um par de sandálias e alguns documentos amarrotados em um saco plástico.

A todo esse quadro se sobrepõe a humilhação de ter que permanecer durante o tratamento em “pousadas” ou “casas de apoio”, uma espécie de submundo do câncer. Lugares inadequados, improvisados e inóspitos, frutos da ação de meia dúzia de abnegados e que ainda se mantém funcionando graças à caridade de uma minoria.

Como animais feridos e acuados, arrancados do seu mundo eles sacolejam em conduções mal ajambradas.

Abandonados por quem de direito, entregues à própria sorte ou ao próprio azar, eles tentam, obstinadamente, sobreviver. Sem idade e sem identidade, sem um lugar onde possam repousar seus corpos mutilados e sua alma atribulada se tornaram a própria expressão do descaso.

Eles são uma afronta às frivolidades da sociedade civil envergonhada, que na sua correria frenética busca apenas multiplicar seus milhões, engordar suas contas bancárias acumular tanto patrimônio que sequer terá vida suficiente para usufruir. Empanturrados de bens materiais alguns até enriqueceram com a indústria do câncer, mas anestesiados pelo excesso de bens de consumo ignoram solenemente esse holocausto tupiniquim. Na sua pauta não cabem temas escabrosos, já que vivem atormentados constantemente pelo noticiário, a queda do dólar, a guerra cambial, as trapalhadas do ENEM, o Tiririca e outros temas mais interessantes. As suas agendas estão lotadas de compromissos inadiáveis como as festas natalinas, que se aproximam, as compras milionárias, as viagens ao exterior e as barulhentas confraternizações de final de ano.

E nas noites de domingo quando os comboios ligam seus motores para recolher os pacientes do interior rumo à capital estamos todos muito ocupados para pensar nesse assunto, temos uma segunda-feira pela frente com a agenda sobrecarregada e nada mais natural que relaxar, vendo os shows de gols da rodada, as garotas do Fantástico, o Gugu ou alguma sessão coruja.

O ICT- Instituto Cristina Tavares de Apoio ao Adulto com Câncer tem como um dos seus principais objetivos a construção de um abrigo onde essas pessoas possam permanecer com dignidade durante o tratamento de câncer no Recife. Coisa simples, sem luxo, que não vai levar mais que um percentual infinitesimal da sobra do supérfluo das classes mais abastadas, mas de fundamental importância para a inclusão desses pacientes nos padrões mínimos da dignidade humana.

É um tema deveria fazer parte da agenda da sociedade civil, em especial das pessoas e das instituições envolvidas direta ou indiretamente com essa chaga social invisível, causadora de uma dor generalizada e silenciosa chamada insensibilidade.

Fonte: Vera Moreira
Autor: Antonieta Barbosa
Revisão e edição: de responsabilidade da fonte

Imprimir Enviar link

   
     
 
Comentários
 1 comentários


Fernando Ribeiro 
parabens pelo texto e pela sencibilidade.
22/10/2011 
   
       
     


     
   
     
   
     
 


























 
     
   
     
 
 
 
     
 
 
     
     
 
 
       

+55 (51) 2160-6581 e 99997-3535
appel@consumidorrs.com.br