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Paulo Antenor de Oliveira e Roberto Carlos dos Santos
   
     
 


25/04/2009

Paulo Antenor de Oliveira e Roberto Carlos dos Santos
Guerra fiscal entre municípios e o compartilhamento de domicílio tributário entre empresas

Muito se comenta a respeito do que se convencionou chamar de guerra fiscal, a qual pode ocorrer tanto entre estados, como entre municípios, em relação aos tributos de competência de cada uma dessas esferas governamentais. Em tempos de crise financeira, esse assunto ganha ainda mais importância. Os mecanismos jurídico-constitucionais hoje existentes não parecem resolver satisfatoriamente os problemas direta e indiretamente relacionados à disputa de arrecadação entre os diversos entes federativos. 

Tal como ocorre em relação ao Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços – ICMS, e outros tributos de competência estadual, também no nível municipal há utilização de benefícios fiscais como atrativos para fixação de empresas nos respectivos territórios. Com isso, aumenta-se a arrecadação. Nos municípios, a redução de alíquotas do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) tem servido a essa finalidade.
 
Em tese, tais benefícios e reduções, mantidos em níveis razoáveis, seriam até certo modo positivos para a sociedade, uma vez que tenderiam à contenção da carga tributária. Mas a questão não é assim tão simples.
 
O acirramento dessas disputas acaba gerando problemas de arrecadação para os próprios entes federativos, o que irá prejudicar, na outra ponta, serviços essenciais para a população, nas áreas de saúde, educação, segurança, infra-estrutura, saneamento etc.
 
Outro aspecto, mais grave, é a tendência a se criarem “paraísos fiscais” municipais que atraiam não somente investimentos produtivos (o que seria desejável), mas também o registro de empresas que, em verdade, não existem, ou não exercem suas atividades naquele município; ou, ainda, servem apenas para ocultar relação trabalhista.
 
Essa prática pode ser facilitada se um município liberar, de modo pouco criterioso, alvarás de funcionamento que permitam a inúmeras empresas, de diferentes ramos de atividades, alojarem-se em um mesmo espaço físico. De posse desses alvarás, tais empresas serão levadas ao registro no cadastro de CNPJ. Assim, a base cadastral da Receita Federal do Brasil refletirá essa situação.
 
Não há, em princípio, nenhuma irregularidade na instalação de uma empresa em um município que promova atrativos fiscais. A irregularidade surge quando o funcionamento da empresa é fictício. Por exemplo, mais simples: quando exerce, de fato, suas atividades em um município, mas é registrada em outro, apenas para gozar de benefícios fiscais. Nesses casos, “a autoridade administrativa pode recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo” (Cód. Trib. Nac. – Lei 5.172/66, art. 127, §2º).
 
Também não há problemas para a coincidência de domicílios tributários, desde que – enfatize-se bem – as empresas verdadeiramente funcionem no endereço indicado ao Fisco e que haja viabilidade da divisão do espaço, inclusive no que diz respeito às legislações não tributárias (sanitárias, de posturas etc). O que é de se combater é a existência de empresas “de fachada” cuja criação teve por finalidade principal a burla da legislação (em especial a tributária ou a trabalhista, quando não se prestam a ilícitos ainda mais graves).
 
O interessado em abrir uma empresa deve tomar cuidados na escolha do escritório que realizará o necessário registro. Seguramente, a maioria desses escritórios é dirigida por profissionais corretos, sérios, mas, eventualmente, pode-se encontrar algum que não o seja. Daí, o interessado pode ser estimulado a registrar um funcionamento fictício em município distinto daquele onde de fato exerce atividades. Diante de uma sugestão dessas, não somente deve recusá-la de pronto, como deve também procurar outro profissional.
 
Por outro lado, não são os fatos que se devem amoldar à legislação. É a legislação que deve ser estruturada em compasso com a dinâmica de evolução dos fatos sociais. Nesse sentido, é de se verificar que há um problema social que merece respostas legislativas adequadas. Para fugir de encargos trabalhistas e tributários, algumas empresas estão a substituir o contrato formal de trabalho pela contratação de empresas individuais prestadoras de serviços.
 
A referida substituição apresenta-se como burla à legislação (trabalhista e tributária, em especial) quando as características da relação indicam se tratar, em verdade, de relação de emprego. Isso ocorre quando há subordinação do trabalhador às ordens do empregador, exclusividade, jornada de trabalho determinada (não-eventualidade na prestação do serviço) e quando os serviços são prestados em caráter pessoal pelo trabalhador.
 
Esse assunto gerou debates acalorados, ao tempo da lei de criação da Super-Receita. A polêmica girou em torno da Emenda nº 3 ao Projeto de Conversão relativo à MP nº 1915, que foi aprovada no Congresso Nacional e vetada pelo Presidente da República. Resumidamente, a emenda dispunha que a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implicasse reconhecimento de relação de trabalho deveria ser precedida de decisão judicial, o que foi considerado, pela corrente contrária a essa emenda, como prejudicial ao combate de fraudes trabalhistas e tributárias. Do lado oposto, houve grande pressão de defensores da “flexibilização” das relações de trabalho.
 
Em função do desemprego que grassa em níveis alarmantes, tem sido cada vez mais freqüente o fato de o(a) chefe de família se submeter à perda de direitos trabalhistas como férias, décimo-terceiro salário, FGTS, recolhimento ao INSS, seguro-saúde, salário-família etc, em favor exclusivamente da obtenção do emprego. Para aderir a essa forma de contratação, espúria e irregular quando os objetivos do contratante são voltados à fraude contra a legislação trabalhista e tributária, o contratado terá de abrir uma empresa.
 
No que se refere ao trabalhador, é mais vítima do que cúmplice desse modo “moderno” de contratação. O pressuposto é o de que é a necessidade, e não a vontade de ludibriar os controles públicos, que levam os trabalhadores a aderir a esse tipo de contrato. Por isso mesmo é que os fatos estão a indicar necessidade de reestruturação tanto do Sistema Tributário Nacional, quanto da legislação trabalhista, de modo a tornar pouco vantajosa essa prática para o contratante.
 
De igual modo como ocorre com os que abrem empresas em municípios diversos daqueles em que exercem suas atividades para obter redução da carga tributária, também esses trabalhadores podem, inadvertidamente, realizar o registro de suas empresas por intermédio de escritórios que tenham por (mau) costume a utilização de endereços compartilhados, em determinados municípios, para servirem de domicílio tributário a sua clientela.
 
E há riscos para os responsáveis por empresas nessas condições. Visualize-se a seguinte hipótese: o interessado registra uma empresa em domicílio tributário compartilhado com outras, em município distinto daquele onde as atividades são efetivamente exercidas. Variadas são as causas que podem levar alguém a fazê-lo: ingenuidade, baixa instrução, necessidade premente de obter emprego ou a tentação de obter alguma diferença de tributação. O mais provável é que não conheça as demais empresas (fictícias ou não) – clientes do escritório que realizou o registro – com as quais a sua irá compartilhar endereços físicos e domicílios tributários. É bem possível, principalmente quando em grande quantidade, que nenhuma dessas empresas funcione de verdade nesses endereços.
 
Assim, por hipótese, qualquer evento ilícito (tributário ou de qualquer outra natureza) que ocorra em um desses endereços tenderá a levantar suspeitas sobre todos, indistintamente, ainda que eventualmente realizado apenas por uma pessoa ou empresa. Haverá, no mínimo, certa dificuldade em se provar que nem todas as empresas situadas no mesmo endereço cometiam o hipotético ilícito.
 
Há necessidade de que os sistemas informatizados das Administrações Tributárias estejam preparados para detectarem coincidências de domicílios tributários. A partir de determinado número, a respectiva fiscalização deve ser imediata e automaticamente acionada. Assim, podem-se identificar os casos irregulares, para fins de correção e punição. Há necessidade, também, de integração e cooperação entre os entes federativos, inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, conforme preconiza a Constituição (art. 37, XXII, da CF/1988), para que se possa combater, de modo eficaz, as referidas fraudes. A liberação de alvarás de funcionamento, por parte de municípios, também merece toda atenção e rigor.

Paulo Antenor de Oliveira – Presidente do Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal (Sindireceita) e Roberto Carlos dos Santos – Diretor do Sindicato Nacional dos Analistas-Tributários da Receita Federal

Fonte: Vera Moreira
Autor: Paulo Antenor de Oliveira e Roberto Carlos dos Santos
Revisão e edição: Renata Appel

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